quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Tá na hora de ser adultinha!

Pois então, o título diz tudo.

Eu sempre tive, em várias situações, visões completamente opostas de mim mesma.
Acho que isso vem de ter sido criada em dois mundos. Duas famílias e situações diferentes, ao mesmo tempo.

Oi, narcisismo!


Para minhas primas, naqueles terríveis anos da adolescência, eu era a única que morava na capital. Filha única. Eu era, consequentemente, mimada e patricinha. Eu acho que nessa parte da minha vida eu aceitei esse papel pra mim. A gente aceita papéis, inclusive os que impomos sobre nós mesmos.
No outro lado, na cidade grande, no colégio, eu não era nem de longe mimadinha ou patricinha. Acho que é a comparação. Eu era a guria meio grande, que às vezes falava alguma piada, tinha mil coisas extra classe, tocava uns instrumentos aí, lia umas coisas, saía pra acampar ou que achava normal fazer xixi no mato.

Tá certo, eu era mais do que isso, eu acho. Mas vocês entendem onde eu quero chegar?
Eu estou sempre preocupada em QUAL das caixinhas tipificadoras eu seria colocada. Mesmo que a realidade não fosse bem assim.

Eu nunca soube o que eu sou ou o que eu quero ser. Quando eu me maquio, me arrumo, penso, ao mesmo tempo, que as outras pessoas me acham uma farsa, uma desengonçada troglodita que quer se fazer feminina e arrumadinha, tentando cumprir um papel, ou, no extremo oposto, que eu sou uma pessoa extremamente fútil, só preocupada com a aparência. Essas duas Lúcias me perseguem minha vida inteira.

Eu sou prática e ao mesmo tempo romântica. Troglodita e ao mesmo tempo extremamente sensível. Fui acusada de ambos. Eu sou tranqüila e ao mesmo tempo sofro de ataques de ansiedade. Eu não dou tanta importância pra alguns detalhes da minha aparência, não faço escândalo com um cabelo fora do lugar ou uma unha quebrada, mas adoro maquiagem e comprar roupas novas.
Eu acho que eu sou normal, no fim, mas essa patrulha do não poder ser conflitante, do 8 ou 80, me aflige. E ser adulto te coloca, de certa forma, cada vez mais nessas caixinhas.

Só que se tornar adulto num país diferente, numa língua diferente, numa tela em branco, é diferente.
Na família dos Collischonns inteligentes, criativos e práticos eu sempre fui ativa na parte artística, mas sempre fui a que “não gosta de trabalhar”, “a que tira o corpo mole na hora de lavar a louça”.
Tá certo, eu odeio lavar a louça, e acredito no ócio criativo pós-prandial. Mas isso não vem ao caso.

Quando eu disse que ia pra Alemanha, ouvi muitos “não sabe cuidar de si mesmo no Brasil, como vai fazer em outro país?”. Pensando na Lúcia mimada, folgada e preguiçosa, óbvio.

Mas não sei de onde surgiu essa do “não sabe se virar”.

Todos sabem que, para ter que se virar, é necessário primeiro estar em uma situação em que isso seja necessário. Eu não estive nessa situação muitas vezes, pois tenho sorte, e quando estive, ADIVINHEM, me virei.

Eu funciono na pressão, escrevo trabalho na noite anterior. Mas eu me viro. Eu sempre dou um jeito.
Acho que o segredo  é não se fingir adulto. E isso eu sei bem. Eu sei perguntar, sem medo de parecer idiota, e estou fazendo muito isso aqui, em outra língua e cultura.
A alegria de lavar minha própria roupa, por exemplo, e a vergonha de admitir pra minha “mãe” aqui que eu, na verdade, nunca fiz.

Sim. Me julguem. Eu nunca tinha lavado uma roupa na máquina.

Mas eu aprendi, quando precisei. Eu aprendo e, no fim, me viro.

Não tem muito segredo.

O bom dessa tela em branco é que ninguém me vê como mimadinha patricinha adultinha ou troglodita. Eu posso ser quem eu quiser.

O ruim disso é eu eles só podem me ver como isso que eu sou agora, não como a pessoa que eu fui ou o que eu já fiz e conquistei.

Mas acho que novos começos são assim mesmo.
Viajar não resolve nossos problemas, carregamos eles conosco, mas viajar nos dá a oportunidade de um novo começo, talvez me dê a oportunidade de escrever uma nova Lúcia, um pouco mais adultinha, menos patricinha ou bichinho do mato.

Na verdade, me deixem ser o que eu quiser ser, com diminutivos ou não.


E isso eu digo pra mim mesma, já que sou a minha maior censora de identidades.

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Carta para Catarina

Querida Catarina,

Aqui quem fala é a dinda. 
Ou prima. 
Como tu quiser me chamar.


Eu vi teu primeiro banho.
Eu vi a felicidade incomparável de um recém-pai.
Tua mãe cansada e feliz me abanando de longe.
Eu vi tua primeira casa. Lá eu vivi muitos momentos felizes.
Eu fugia pra lá em momentos de crise, pra ouvir conselhos, comer nachos, dançar ou pintar o cabelo.
Pra rir, pra compartilhar gargalhadas.
Teus pais eram pais antes de serem pais.

Eu lembro da tua primeira imagem, eu lembro de todos querendo dar palpite sobre quem seria a Catarina.
Espero que tu viva livre de palpites. E se os tiver, que saiba aceitá-los.
Espero que a vida seja tão boa quanto estar na barriga da mãe ouvindo ela cantar pra ti.
Eu provavelmente não vou ouvir ou estar próxima para presenciar tuas primeiras palavras.
Talvez nem os primeiros passos.
Talvez demore pra que tu saiba quem eu sou.
Quando a gente é assim, novo no mundo, só reconhece quem é presente.
Tua mãe também não viu meus primeiros passos, nem minhas primeiras palavras.
Mas ela tem um dos primeiros espaços no meu coração.
Assim como presenciou os primeiros choros de dor de cotovelo, e muitas primeiras alegrias.
Uma das minhas dindas quase nunca esteve no mesmo continente.
E hoje ela nem está.
No mundo.
Ela, com suas cartas e as ocasionais conversas na beira da praia, povoou minha infância e sempre esteve, pelo menos no meu coração, na mesma casa, na minha casa.
Eu espero que eu também povoe algum tipo de experiência tua.
Eu espero que eu veja muitos dos teus primeiros.
Assim como tu és minha primeira, e a primeira para muitos.
Eu espero que meu choro de saudade seja o teu primeiro.
Mas não chora, é um choro de felicidade também.
Pra conquistar algumas coisas às vezes precisamos de saudade.
Mas espero que tu nunca tenha que chorar de saudade.
E que se for, que seja por um motivo bom.
E que se for, que não seja só por primeiros, mas por últimos e meios também.
A dinda te ama, sem nem te conhecer tanto assim.


Muitos beijos da fria Hamburgo,

Lúcia


quarta-feira, 19 de novembro de 2014

De abraços e carinhos

Eu gosto de abraçar.
Eu gosto de pessoas que abraçam. Eu sou uma dessas pessoas.
Mas eu aprendi e ainda aprendo todos os dias que o toque e o abraço constante não são as únicas maneiras de se demonstrar carinho.
Assim como eu me irrito quando supõem que a minha cultura é fraca por ser mais abertamente "calorosa" ou mais emotiva, me irrito quando me pego pensando que o modo diferente de demonstrar carinho, que não seja o mesmo que o meu, significaria a falta dele.

Não é falta.

Eu só não conheço ainda as pessoas aqui o bastante pra me sentir à vontade para o abraço.

O abraço é muito íntimo.

Eu não achava isso antes, agora eu acho.
Só que eu adoro surpreender alguém com um abraço. Às vezes é só isso que a gente precisa.
É legal surpreender alguém com intimidade.
No trem, um pai e um menininho, quase bebê, a criança não parava quieta, queria ficar em pé, e acabou encostando no meu joelho.
O pai ficou morrendo de vergonha.
"Para com isso! Tá incomodando a moça"
Eu olho, sorrio e digo "tudo bem, não tem problema" e volto a ler meu livro.
Esse pai ficou tranquilo.
Ele não tava incomodando a moça.
Eu gosto de ser a pessoa que não está sendo incomodada.

Eu aprendi, nos tempos de pré-adolescência, o significado de carinho. Achava que minha avó não gostava de mim porque ela não era tão "carinhosa" que nem a outra vó.
Só que fazer cachecóis, blusões, biscoitos e pão com mel é uma das várias maneiras de demonstrar carinho. Assim como insistir que eu tocasse direito alguma música na flauta porque, afinal, ela sabia que eu conseguia, e eu achava aquilo tudo muito chato.
O carinho é uma coisa muito tênue.
Eu ainda adoro o abraço, mas aprendi que o carinho está em coisas muito pequenas também.
O carinho tá, ao mesmo tempo, na mãe que diz "vai, te manda pra alemanha e aproveita muito lá" e do pai que chora e diz "com quem eu vou ver anaconda agora?"

Faz quase um mês que estou aqui. É pouco.
Mas eu sinto mesmo assim. Sinto falta do abraço que a virtualidade não pode me dar.
Mas aí de novo, sou eu achando que carinho é só isso.
Carinho é também quando o Julius chega em casa e grita 'HALLOOO' ou quando vem correndo na minha direção, abraça minhas pernas e diz "Niniiiiii"
Carinho é também quando a Clara segura na minha mão ou me dá tchau da janela.
Carinho é quando a Tini me põe um bule de chá separado só pra mim ou me alcança o tipo de pão que eu gosto.
Ou quando o Lorenz chega do trabalho e diz "Na? Wie war's?"
Carinho é quando a caixa do supermercado diz "Moin moin"

Tá, talvez isso não seja. Ela diz isso pra todos.

E quando vou visitar o primo do meu vô para um chá, ele me abraça longamente. Eu aproveito aquele abraço de Opa. É um pouquinho do meu jeito de demonstrar carinho.

Quem sabe quando eu conhecer melhor as pessoas aqui posso começar a demonstrar a minha forma de carinho.
Que é aquele abraço inesperado numa manhã de inverno.

Por enquanto, vou me contentando com os bules de chá e os ''moin moin'' de cada dia.



quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Hessen Park, ou "o Opa pira!"


Quem não entende alemão deve ter pensado outra coisa muito sem pé nem cabeça ao ler esse título.
Eu explico:
Esse é um post dedicado ao meu Opa e à minha Oma (vô e vó), duas pessoas dedicadíssimas não somente aos papéis de pais, avós, profissionais, mas também no fomento da cultura alemã dentro do lar e na comunidade onde eles vivem. 
Esse é um textinho dedicado a vocês.

Então. Logo antes de eu me bandear pros lados de Hamburgo, meus queridos anfitriões me levaram pra conhecer o Hessenpark, um parque de tradições da região de Hessen. O parque tem um pouco de cada região e das profissões que foram e ainda são importantes pra vida em uma comunidade. Como parte da nossa família é dessa região, esse parque é ainda mais interessante. Mas ele também é interessante porque...

OLHA QUE BONITINHO!!


Durante todo o passeio fiquei pensando "ai, o Opa e a Oma TINHAM QUE VER ISSO AQUI" ou "TÁ IGUAL O PARQUE HISTÓRICO DE LAJEADO"

AHAM.

Explico porque.

Primeiro, encontro essa placa:


(pra quem não sabe, Schreiner é a família da minha Oma)

depois, vejo essa escola


daí, vejo um tear

(eles tem Workshops, vó, FICADICA)

Mas o mais legal foi ver várias famílias com crianças passeando por ali, e participando de todas as ações. Cortar madeira, fazer ferradura, cortar madeira, tudo, tudo e tudo. Era uma tentativa de fazer essa nova geração entrar mais em contato com essas atividades mais manuais, e menos com telas de smartphones e brinquedos de pilha. 


No fim, o que eu queria mostrar pra vocês eram as fotos que eu tirei, várias de coisas contra o sol, o que parece ser o meu "olho" pra fotos.

vide:





Mas vamos ficar felizes porque, afinal, tinha sol e céu azul.

Tinha também muuuuuita foto de coisas que eu achei interessante e tinha medo de não lembrar o que eram, e, de fato, eu não lembro o que algumas dessas coisas são. 









Por fim, pra Oma. Essa loja vende peças de artesanato em madeira feitas por uma associação de deficientes da região. Não é uma ideia legal?



Pro Opa, umas fotos bonitas...




E um oi dos meus anfitriões:

Enfim, esse texto é pra vocês porque eu sei que vocês leem esse blog :) E também pra agradecer por tudo, inclusive pelo contato constante que o Opa manteve com os primos daqui, o que me deu um teto, uma família aqui, e muito carinho recebido todos os dias. Ah, e agradeço por vocês terem feito a minha mãe e por todos os spekulatius, pflaumkuchen, spätzle, e por todos os abraços apertados e risadas cúmplices na mesa do almoço. 

Vielen Dank :)

Beijos 
e
Queijos dos Nibelungos

Lúcia e até agora não comi Kartoffelpuffer

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Simples Camponesa de Nobre Coração que vai Todos os Dias ao Bosque Recolher Lenha



Então, gente, eu fui num bosque. BOSQUE. BOS QUE. B O S Q U E.

Eu amo essa palavra. BOSQUE.



Digo bosque porque não era bem uma floresta.
Mas também não era um mato.
Nem um arbusto.

Não. Era um bosque digno das histórias que eu lia quando criança. É óbvio que como pottermaníaca precoce minha infância foi povoada por pessoas tomando cerveja amanteigada, ganhando suéter de natal (HELLO, 40 GRAUS QUE BONITO ESSE SUÉTER), e castelos e sobretudos e BOSQUES.

Então os bosques tem um significado especial pra mim. Algo familiar (na minha imaginação) e completamente estranho (no mundo um pouco mais real).




Só digo uma coisa: se eu tivesse um bosque do lado da minha casa eu nunca ficaria em casa. Ao mesmo tempo, IMAGINA DE NOITE (bruxa de Blair). Enfim.

Então, como eu não lembro o nome do bosque (sorry Rebecca) e como eu gosto muito de bosques, eu escrevi um texto inteiro sobre bosques.



I hit a new low

Lúcia (comi batata (frita) ontem)

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Um “cheguei!” atrasado


Então, um pouco atrasada começo meu relato.


Minha viagem foi tranquilíssima, tive muita sorte com tudo, desde os lugares onde fui até a quantidade de horas dormidas no avião. Quando cheguei, porém, Frankfurt não me recebia com muito sol, mas fui recebida por rostos amigos. Daí fica tudo bem, não é? Esses amigos fizeram minha semana ser extremamente agradável.

Nesses dias vi um pouco mais da região de Hessen que, no meu conhecimento esparso, se limitava a Kassel e Frankfurt.

Fomos parar em Bad Homburg, uma cidade próxima daqui. Descobri que tenho umas tias-primas-conhecidas da família do meu avô que moravam lá. Do jeito que eu estou cara-de-pau, quase fui dar uma visitinha.


Segundo me conta a Rebecca (minha anfitriã), as cidades com “Bad” no nome são geralmente lugares conhecidos por ter águas minerais usadas para tratamentos, além dos spas. Alguns dizem que a cidade tem que tirar o “Bad” do nome, já que não merece mais o título. Sobre os banhos eu não sei, não compartilho desse amor por banhos quentes no maior estilo “chá de testículo” (me perdoem os de coração forte), mas se a cidade é bonitinha e tem um castelo pra mim tá de boas.


E se a cidade tem um café dentro do castelo, melhor ainda!



E se esse café tem waffles, nem se fala!



E se dentro do café tem estátuas, vocês já podem ter uma idéia de onde eu estarei.



Então, como dá pra ver, não é TÃO difícil me agradar.




Como dá pra ver, minha vida aqui não vai ser tão difícil...



Lúcia (ainda não vi batatas)

*Os posts vem curtos por enquanto. Assim que eu alcançar minha situação atual, vai ter coisas mais legais. Espero.*